quarta-feira, 31 de março de 2010

Livro do mês: Os três casamentos de Camilla S.

FARIA, Rosa Lobato de - Os três casamentos de Camilla S.. Alfragide : Asa II, 2010. 197, [2] p.

Os três casamentos de Camilla S. é a autobiografia de uma velha senhora que aos noventa anos decide contar a sua vida, incluindo o que ela possa ter de inconfessável.

“Não sei se conseguirei acabar de contar a minha vida, se é que ela já não se contou a si própria. Mas pelo menos gostaria de falar dos meus três casamentos porque eles pautam a vivência de três mulheres diferentes que são todas eu. Poderia considerar três ciclos que se interligam e se separam, se sobrepõem e se distinguem, que entre si se criticam, se julgam e se perdoam: o ciclo do sonho, o ciclo do corpo e o ciclo do coração”.

O romance com uma estrutura de diário tem início a 4 de Janeiro de 1902, dia de viragem na vida de Camilla: aos doze anos, o seu primeiro casamento é anunciado.
A 20 de Março de 1922, depois de em 1919 ter enviuvado Camilla casa pela segunda vez, e em 1926 dá se o divórcio. O terceiro e último casamento, acontece em 1945. Cada casamento simboliza no fundo uma etapa da vida desta mulher e corresponde a várias fases de amadurecimento. Paralelamente aos vários casamentos, uma grande paixão acompanhou Camilla ao longo dos anos, paixão que influenciou todo o seu percurso vivencial.

“Atraiçoei o Emídio em pensamentos e ele morreu. Arrastei o André para a prisão e sabe Deus que desgraças o esperam. Destrocei a vida do Salomão pela minha fraca cabeça, o meu egoísmo, a minha incapacidade de me controlar. Não sei como penitenciar-me de tudo isto e os meus pecados ainda não acabaram. Agora sinto que abandonei o Carlos Eduardo, cada vez o acho mais distante, embora venha ver-me duas ou três vezes por ano. Fui uma má mãe, uma má esposa, e uma má mulher. Porque é que não percebemos que erramos quando estamos a errar e só mais tarde o remorso nos cai em cima com uma força esmagadora e nos amargura o resto da existência? A paixão não explica nem desculpa tudo. Quis tanto ser eu, ter uma vida própria, correr os meus próprios riscos, quis transgredir, conhecer os meus limites e, se por um lado posso dizer que vivi, por outro direi que morri mil vezes.”

Escrito numa linguagem simples e envolvente, este é um romance que nos cativa da primeira à última passagem. Foi o terceiro romance de Rosa Lobato de Faria e com ele esta escritora confirmou o seu lugar de destaque no panorama da nova ficção portuguesa.

A autora:

Rosa Lobato de Faria nasceu em Lisboa em Abril de 1932. Poetisa e romancista, o essencial da sua poesia está reunido no volume Poemas Escolhidos e Dispersos, de 1997. O seu primeiro romance, O Pranto de Lúcifer, veio a público em 1995. Seguiram-se-lhe Os Pássaros de Seda (1996), Os Três Casamentos de Camilla S. (1997), Romance de Cordélia (1998), O Prenúncio das Águas (1999), A Trança de Inês (2001), O Sétimo Véu (2003), Os Linhos da Avó (2004), A Flor do Sal (2005), A Alma Trocada (2007), A Estrela de Gonçalo Enes (2007) e As Esquinas do Tempo (2008).
É também autora de diversos livros infantis e conhecida do grande público como actriz de televisão e cinema.
Faleceu a 2 de Fevereiro de 2010

quinta-feira, 18 de março de 2010

A riqueza da linguagem poética

Uma das primeiras coisas que aprendemos enquanto crianças é como falar. Diariamente através da leitura de histórias as crianças vão se familiarizando com palavras e sons. Pais e educadores lêem histórias, mas também lenga-lengas e rimas infantis, que são caracterizadas como jogos de palavras que se apresentam numa estrutura rítmica agradável e de fácil compreensão. Estas rimas constituem por assim dizer o nosso primeiro contacto com a poesia.

A poesia é uma das aplicações mais vivas da linguagem, e quem melhor para entender este jogo de palavras de que as crianças? Obviamente nem todas as crianças se deixam cativar de imediato pela poesia ou pela literatura, porém por vezes a única coisa necessária para o conseguir é encontrar o poema, a rima ou o livro certo para despertar o seu interesse. Aprender poesia tem um importante papel nas nossas vidas, não só aprendemos a ler com os nossos olhos e ouvidos, mas também nos tornamos capazes de usar a nossa imaginação para extrair ou colocar em palavras sentimentos e emoções. A linguagem poética é uma das mais interessantes, porque mexe com o nosso sentimento, a nossa sensibilidade.

O contacto da criança com a poesia proporcionado pela família deve ser prolongado e aprofundado pela escola. A escola tem o papel de ajudar a formar a criança, não apenas a nível da razão, mas também a nível da emoção e a poesia é um instrumento privilegiado para proporcionar aos jovens o contacto com a beleza das palavras, os seus significados e as suas formas. O texto poético é um espaço de grande riqueza e amplitude, capaz de permitir a libertação do imaginário e do sonho das pessoas, é também um meio privilegiado para despertar o amor pela língua materna. A rima, o ritmo e a sonoridade, permitem uma descoberta progressiva das potencialidades da linguagem.

No entanto e parafraseando José António Franco em A poesia como estratégia “não basta incluir nas planificações diversos tipos de texto poético. Não basta deixar que as aulas se arrastem na leitura e interpretação de textos com os quais não foi promovida qualquer tipo de familiaridade. São necessárias a competência científica e a capacidade pedagógica para que a sua abordagem resulte, realmente, numa verdadeira educação da sensibilidade e do gosto, no desenvolvimento do espírito crítico e da criatividade, na aquisição de uma desejável mestria comunicativa construída, inevitavelmente, a partir do domínio dos mecanismos da língua materna e do prazer e realização pessoais que uma comunicação autónoma e competente pode provocar.”
Miriella de Vocht

quinta-feira, 11 de março de 2010

O fim de Philip Banter

BARDIN, John Franklin - O fim de Philip Banter. Lisboa : Terramar, 1994. 274 p. ISBN 972-710-088-0

O fim de Philip Banter é um romance psicológico que decorre nos finais dos anos 30, princípios dos anos 40. É a história de um drama surreal em que a personagem principal é Philip Banter. Este encontra-se bastante perturbado com o colapso eminente do seu casamento, e essa perturbação aumenta quando encontra na sua secretária de trabalho uma “confissão”, aparentemente escrita por ele mesmo, que prevê acontecimentos e atitudes que ainda não tiveram lugar.

Apesar de sofrer de problemas de alcoolismo, Philip não acredita que esteja assim tão mal e não se deixa convencer que está esquizofrénico ou mentalmente desequilibrado. Não acredita que esteja a sofrer de paranóia e vai-se dedicar a desvendar a tese de que alguém o está a tentar enlouquecer.

Este romance envolve-nos do princípio ao fim e está de tal modo escrito que a angústia da personagem principal perante o desenrolar dos acontecimentos nos atinge em cheio.

Excerto:

“Era possível, que na noite anterior, bêbado como estava, tivesse decidido ir ao escritório e escrito a «Confissão». Depois, devia ter ido para casa, para a cama e ter-se esquecido. A única falha deste raciocínio – se é que havia falha – residia na sequência temporal. Como poderia prever que conheceria e se atiraria a uma mulher que ele nunca vira? E contudo, quem se não ele estaria melhor documentado para fazer tal previsão?”

segunda-feira, 8 de março de 2010

A aprendizagem da língua portuguesa

A aprendizagem da Língua Portuguesa é uma tarefa cada vez mais difícil pois as crianças, hoje em dia, apresentam inúmeras lacunas nesta área, principalmente pouca motivação intrínseca para aprenderem. Nesta perspectiva, torna-se premente que as actividades que planificamos e organizamos para serem implementadas na sala de aula, tenham por base o imensurável número de experiências que os alunos trazem para a escola, em virtude de elas serem um factor de empenhamento para a aprendizagem.

O desempenho das nossas crianças depende da nossa actuação pedagógica e o nosso objectivo é que elas atinjam o sucesso. E para que elas atinjam o sucesso devemos estar permanentemente actualizados e não ignorarmos os estudos realizados a nível do ensino da língua e das suas implicações educativas.

A leitura liberta e abre as portas do conhecimento. E o conhecimento, na sociedade actual, é a porta para a qualidade de vida, para a saúde e para a prosperidade. Por isso temos de estar mais atentos à especificidade dos obstáculos conceptuais colocados às crianças na aprendizagem da leitura. Temos que nos consciencializar de que temos que adquirir uma nova postura educativa. Temos ainda de organizar e promover actividades pedagógicas de modo a dotar os alunos das ferramentas necessárias para o domínio pleno da leitura e da escrita.

Assim sendo, a finalidade primordial da minha actividade educativa é procurar fazer com que os meus alunos, lendo, ouvindo, falando, recontando, pesquisando, escrevendo, desenhando, divulgando…, desenvolvam o gosto pela leitura e pela escrita e se tornem leitores activos e escreventes competentes, dotados de meios que lhes permitam adaptar-se a variadas situações e lhes possibilitem a educação permanente e liberdade intelectual, por forma a exercerem em pleno a cidadania e a participarem activamente na sociedade.
Maria João Cavaleiro
Professora bibliotecária

quarta-feira, 3 de março de 2010

Livro do mês: A cidade dos anjos caídos

BERENDT, John - A cidade dos anjos caídos. [Lisboa] : Círculo de Leitores, D.L. 2006. 392, [1] p. ISBN 972-42-3710-9

A cidade dos anjos caídos, da autoria do jornalista e escritor norte-americano John Berendt, é um retrato íntimo de Veneza, uma cidade que sobreviveu a inundações, corrupção governamental, invasões, subida do nível das águas e tentativas de organizações internacionais para a tentar “salvar”, conservando-a como um bastião da arte e um lugar de beleza única.
Esta história baseada em factos e personagens reais tem início a 20 de Janeiro de 1996, quando um grande incêndio destruiu o histórico teatro La Fenice.
John Berendt chega a Veneza 3 dias depois do incêndio, fora da época alta, nas poucas semanas em que a cidade pertence de facto aos venezianos e transforma-se numa espécie de detective, descobrindo que por trás das histórias de alguns dos excêntricos habitantes da cidade pode estar a resposta para o mistério sobre o fogo, que afinal pode ter tido origem criminosa.

A cidade dos anjos caídos é um livro que nos dá uma nova perspectiva sobre Veneza.
“Talvez se tenha chegado a um ponto em que não se podem fazer muitas observações novas sobre Veneza, mas pessoas nunca se esgotam; há sempre novas pessoas, novos personagens, novas histórias. Eu sabia que iria conseguir um olhar novo sobre Veneza”. (John Berendt)

Alguns dias após a minha chegada, comecei a ponderar a hipótese de prolongar a minha estadia e ficar a viver em Veneza durante uns tempos. Aos dezasseis anos, tinha aprendido umas noções básicas de italiano durante o Verão que passara em casa de uma família italiana de Turim, integrado num programa de intercâmbio escolar, e ainda me lembrava de algumas coisas. Não tinha dificuldade em ler o jornal, entendia razoavelmente o italiano falado e sabia o bastante para me fazer entender.
Decidi viver num apartamento e não num hotel. Passearia pela cidade acompanhado de um bloco de notas e, ocasionalmente, de um pequeno gravador. Não teria nenhum programa rígido a cumprir, mas daria mais atenção às pessoas que viviam em Veneza do que aos onze milhões de turistas que a calcorreavam, ano após ano.”

O autor:

O escritor John Berendt nasceu na cidade de Syracusa, estado de Nova Iorque, no ano de 1939 e aí passou a sua juventude. Filho de escritores, o jovem foi um brilhante aluno tendo conseguido uma bolsa de estudo para Harvard onde estudou Literatura Inglesa. No ano de 1961 mudou-se para Nova Iorque onde começou a sua carreira como editor e jornalista. É autor dos livros de não-ficção Meia-noite no jardim do bem e do mal e A cidade dos anjos caídos.